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No episódio Nº 072 Silenciamento Feminino: Ana Teixeira lê Várias Mulheres

No episódio de Nº 72 - Silenciamento Feminino: Ana Teixeira lê Várias Mulheres
 

Ana Teixeira é artista visual, formada pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA- USP) e mestra em Poéticas Visuais pela mesma escola. Seu trabalho transita por diferentes meios, com interesse particular pelo desenho e pelas intervenções em espaços públicos, tendo a literatura e o cinema como suas principais referências.

 

Grande parte de sua produção tem a cidade e seus habitantes/passantes como elementos substanciais. Seu trabalho se foca na ideia da arte como uma possibilidade de encontros, que podem ser, antes de tudo, enfrentamentos entre os sujeitos participantes de suas ações e eles próprios.

 

Publicou os livros: Para que algo aconteça (2018), uma compilação de vinte anos de seu trabalho, com textos críticos de curadores e historiadores da arte; Minhas duas avós (infantil – 2017); Cala a boca já morreu! Leitura e coleta de Textos. Silenciamento feminino no acervo da Biblioteca Mário de Andrade (2021).

 

Participou de programas de residência artística no Brasil, Alemanha, Chile, Dinamarca e Canadá, e de exposições em diferentes partes do mundo.

 

Vive entre Colônia, na Alemanha, e São Paulo.

 

Trabalhos da artista podem ser vistos em: www.anateixeira.com


É preciso ouvir as mulheres!
 

 

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CALA A BOCA JÁ MORREU! Leitura e coleta de textos. Silenciamento feminino no acervo da Biblioteca Mário de Andrade

REBECCA SOLNIT, A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. 1ª edição, Companhia das Letras, 2017.

O silêncio é o que permite que as pessoas sofram sem remédio, o que permite que as mentiras e hipocrisias cresçam e floresçam, que os crimes passem impunes. Se nossas vozes são aspectos essenciais da nossa humanidade, ser privado de voz é ser desumanizado ou excluído da sua humanidade. E a história do silêncio é central na história das mulheres.

NAOMI WOLF, O mito da beleza: como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres. Rosa dos Tempos, 2019.

A ideia de que o corpo de uma mulher tem fronteiras que não podem ser invadidas é bastante recente. Está evidente que não desenvolvemos essa ideia o suficiente. Podemos ampliá-la? Ou será que as mulheres são o sexo maleável, inatamente adaptado a ser modelado, cortado e submetido à invasão física? O corpo feminino merece a mesma noção de integridade do corpo masculino?

CHIMAMANDA NGOZI ADICHE, Para educar crianças feministas: um manifesto. Cia das Letras, 2017.

Saber cozinhar não é algo que vem pré-instalado na vagina. Cozinhar se aprende. É uma habilidade que teoricamente homens e mulheres deveriam ter.

COLETIVO NÃO ME KAHLO; BRUNA DE LARA, GABRIELA MOURA, PAOLA BARIONI, THAYSA MALAQUIAS, #Meu amigo secreto: feminismo além das redes, Edições de Janeiro, 2016.

Quantas vezes precisamos explicar a alguém que feminismo não tem nada a ver com ódio aos homens? Quantas vezes nos vemos obrigadas a debater mais do mesmo, nunca fugindo do óbvio, em vez de nos aprofundarmos nas discussões que nos são caras, devido à propagação da desinformação? E quantas vezes, mesmo diante de direitos já conquistados, temos que justificar a necessidade deles, além de, com frequência, vermos esses mesmos direitos serem ameaçados por legislações cada vez mais conservadoras? Por que, ainda hoje, algumas pessoas têm tanto medo do termo “feminismo”? Por que sempre temos que recomeçar nossa discussão da estaca zero?

SIMONE DE BEAUVOIR, O segundo sexo, volume 2: A experiência vivida, Nova Fronteira, 2017.

Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado, que qualificam de feminino.

REBECCA SOLNIT, A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. 1ª edição, Companhia das Letras, 2017.

Uma das razões pelas quais as pessoas se prendem à maternidade como elemento essencial da identidade feminina é a crença de que são os filhos que permitem consumar a capacidade de amar. Mas há tantas coisas a amar além da própria prole, tantas coisas que precisam de amor, tantas outras tarefas no mundo que cabem ao amor...

REBECCA SOLNIT, ANA TERESA FERNANDEZ, Os  homens explicam tudo para mim, Cultrix, 2017.

Quando uma mulher diz algo incômodo sobre a má conduta masculina, ela é rotineiramente retratada como louca, delirante, uma conspiradora maldosa, uma mentirosa patológica, uma chorona que não percebe que foi tudo brincadeira – ou todas as alternativas acima.

MARCIA TIBURI, Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rosa dos Tempos, 2018.

A utopia feminista fala de um outro mundo possível, em que ser mulher não significa ser o destinatário de todo tipo de violência. Não devemos negligenciar que, no patriarcado, o destino das mulheres é a violência.

MARCIA TIBURI, Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rosa dos Tempos, 2018.

Os homens produziram discursos, apagaram os textos das mulheres e se tornaram os donos do saber e das leis, inclusive sobre elas. Tudo o que sabemos sobre as mulheres primeiro foi contado pelos homens. Da filosofia à literatura, da ciência ao direito, o patriarcado confirma a ideia de que todo documento de cultura que restou é um documento de barbárie. Demorou para que as mulheres conquistassem o seu lugar de fala, o seu direito de pesquisa e de memória. O mundo patriarcal não promoveu o diálogo entre os gêneros que ele mesmo construiu. O patriarcado opressor sempre foi a verdadeira “ideologia de gênero”.

FLÁVIA BIROLI, Gênero e desigualdades: limites da democracia no Brasil, Boitempo, 2018.

As mulheres vivem em um mundo no qual não há apenas sexismo, mas racismo, classismo e outras formas de opressão, em um mundo, portanto, em que o “problema da diferença” é na realidade o problema do privilégio.

REBECCA SOLNIT, ANA TERESA FERNANDEZ, Os  homens explicam tudo para mim, Cultrix, 2017.

A maioria das mulheres luta em duas frentes – uma pelo tópico em questão, qualquer que seja, e outra simplesmente pelo direito de falar, de ter ideias, de ser reconhecida como alguém que está de posse dos fatos e de verdades, que tem valor, que é um ser humano.

MARCIA TIBURI, Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rosa dos Tempos, 2018.

Todas as vezes que as mulheres se tornaram indesejáveis ou inúteis, perigosas ou desobedientes, elas foram perseguidas e mortas. Para docilizar as pessoas marcadas como mulheres, foi inventado o termo “feminino”. O feminino é o termo usado para salvaguardar a negatividade que se deseja atribuir às mulheres no sistema patriarcal. O feminino nada mais é do que um regime estético-moral para as mulheres marcadas pela negatividade. Podemos nos perguntar se o elogio do feminino, tal como ele é desenhado na lógica patriarcal, serve para esconder o ódio que se têm às mulheres e ao feminismo.

EVA ALTERMAN BLAY, LÚCIA AVELAR, 50 anos de feminismo. Argentina, Brasil e Chile : a construção das mulheres como atores políticos e democráticos. Editora da Universidade de São Paulo, 2019

O poder público interferia sobre o âmago privado, como o corpo da mulher – impedindo o aborto, por exemplo – ou se eximia quando havia violência dentro de casa.

Foi revolucionária a demonstração de que o que acontece dentro de casa, o privado, é parte da esfera pública, do âmbito do poder.

DJAMILA RIBEIRO, Lugar de fala, Sueli Carneiro; Pólen, 2019.

Um dos equívocos mais recorrentes que vemos acontecer é a confusão entre lugar de fala e representatividade. Uma travesti negra pode não se sentir representada por um homem branco cis, mas esse homem branco cis pode teorizar sobre a realidade das pessoas trans e travestis a partir do lugar que ele ocupa. Acreditamos que não pode haver essa desresponsabilização do sujeito do poder. A travesti negra fala a partir de sua localização social, assim como o homem branco cis. Se existem poucas travestis negras em espaços de privilégio, é legítimo que exista uma luta para que elas de fato possam ter escolhas numa sociedade que as confina a um determinado lugar; logo, é justa a luta por representação, apesar dos seus limites. É preciso cada vez mais que homens brancos cis estudem branquitude, cisgeneridade, masculinos.

COLETIVO NÃO ME KAHLO; BRUNA DE LARA, GABRIELA MOURA, PAOLA BARIONI, THAYSA MALAQUIAS, #Meu amigo secreto: feminismo além das redes, Edições de Janeiro, 2016.

O feminicídio, o estupro e a violência doméstica são os exemplos mais palpáveis das violências que a mulher sofre. Mas são apenas a ponta de um iceberg, cuja parte submersa e que dá sustentação a tudo isso são violências sutis, naturalizadas e reproduzidas no senso comum.

REBECCA SOLNIT, A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. 1ª edição, Companhia das Letras, 2017.

Frase de Audre Lorde, P.27

O que eu lamentava eram meus silêncios. E são tantos silêncios a romper.

SILVIA FEDERICI, Calibã e a Bruxa. Mulheres, corpo e acumulação primitiva. Editora Elefante, 2017.

Uma vez que a as atividades das mulheres foram definidas como não trabalho, o trabalho das mulheres começou a se parecer com um recurso natural, disponível para todos, assim como o ar que respiramos e a água que bebemos.

REBECCA SOLNIT, A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. 1ª edição, Companhia das Letras, 2017.

Não existem mulheres - esses 51% da espécie humana com necessidades tão variadas e desejos tão misteriosos quanto os outros 49% -, mas apenas a mulher, aquela que deve se casar, ter filhos, deixar os homens entrarem e os bebês saírem, como um elevador da humanidade.

MARCIA TIBURI, Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rosa dos Tempos, 2018.

A misoginia é o discurso de ódio especializado em construir uma imagem visual e verbal das mulheres como seres pertencentes ao campo do negativo. A violência física também é linguagem. Atos de violência, seja verbal ou física, seja espancamento ou estupro, são de uma lógica diabólica, que transforma em negativo tudo aquilo que visa a destruir. A misoginia está presente quando se associa as mulheres à loucura, à histeria, à natureza – como se houvesse uma predisposição que conferisse a elas uma inconfiabilidade natural, originária. Essa inconfiabilidade mítica foi criada pelo próprio patriarcado, para abalar a relação das mulheres entre si. Se as mulheres confiarem em si mesmas e umas nas outras, o sistema sustentado na diferença hierárquica entre homens e mulheres e na estúpida desconfiança sobre a potência das mulheres pode ruir.

COLETIVO NÃO ME KAHLO; BRUNA DE LARA, GABRIELA MOURA, PAOLA BARIONI, THAYSA MALAQUIAS, #Meu amigo secreto: feminismo além das redes, Edições de Janeiro, 2016.

Devido a uma falta de entendimento sobre a anatomia da vulva, tanto homens quanto mulheres acreditam no mito de que a vagina possui mau cheiro, quando na verdade o que há é apenas um odor natural (a vagina possui mucosas e não pode ter o mesmo cheiro que a pele da testa, por exemplo), ou no mito de que o melhor orgasmo é o vaginal e não o clitoriano, uma vez que o orgasmo vaginal é o mais conveniente para a prática sexual masculina.

MARCIA TIBURI, Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rosa dos Tempos, 2018.

Na ordem do discurso patriarcal, o “homem branco” é uma figura e uma lógica ao mesmo tempo. Está autorizado a falar sobre todos os assuntos, a fazer o que bem entender, muitas vezes até a perversão, a produzir e reproduzir uma visão de mundo que o favorece. O que se chama de lugar de fala é uma insurgência que afeta o chamado “falocentrismo”, que é a “fala-poder” ou o “poder-fala” do homem branco. A “fala” é autorizada por um “falo” que sempre esteve em posse dos homens brancos, que dominaram os discursos e a produção da verdade.

REBECCA SOLNIT, ANA TERESA FERNANDEZ, Os  homens explicam tudo para mim, Cultrix, 2017.

Não é incomum, quando uma mulher diz algo que contesta um homem, em especial um homem poderoso ou muito proeminente na sociedade, que sejam questionados não apenas os fatos que a mulher afirma, mas também a sua capacidade de falar e seu direito de falar. Gerações de mulheres já foram chamadas de delirantes, confusas, manipuladoras, malévolas, conspiratórias, congenitamente desonestas, e muitas vezes tudo isso de uma só vez.

MARY BEARD, Mulheres e poder: um manifesto, Rosa dos Tempos, 2017.

No que diz respeito a silenciar as mulheres, a cultura ocidental tem milhares de anos de prática.

FLÁVIA BIROLI, Gênero e desigualdades: limites da democracia no Brasil, Boitempo, 2018.

Violência cotidiana e violência política interligam-se em práticas que pressionam as mulheres para permanecer naquele que seria “seu lugar” – ou a ele retornar -, isto é, os espaços doméstico-familiares, a aceitação de formas menos ou mais diretas de tutela masculina.

A qualificação do feminino como docilidade e domesticidade, que se intensifica nos estereótipos maternais e no “familismo”, situa as mulheres no mundo de um modo que torna natural sua ausência dos espaços decisórios.

bell hooks, O feminismo é para todo mundo: políticas arrebatadoras, Rosa dos Tempos 2019.

O mundo do trabalho dentro do patriarcado capitalista de supremacia branca tornou mais difícil para as mulheres ser mãe integralmente. De fato, essa realidade está levando mulheres que escolheriam investir na carreira a ficar em casa. Em vez do pensamento sexista sobre dominação masculina ser o fator que tira as mulheres do mercado de trabalho e as coloca de volta em casa, é o medo de que estejamos criando uma sociedade de crianças “sem pai e mãe” que faz isso. Várias mulheres pensam que carreiras competitivas deixam pouco tempo para construir relacionamentos amorosos. O fato de que ninguém fala em homens deixarem o trabalho para ser pais em tempo integral demonstra até que ponto o pensamento sexista sobre papéis prevalece. A maioria das pessoas em nossa sociedade ainda acredita que as mulheres são melhores na criação de filhas e filhos do que os homens.

REBECCA SOLNIT, A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. 1ª edição, Companhia das Letras, 2017.

Não poder contar a sua história pessoal é uma agonia, uma morte em vida que às vezes se torna literal. Se ninguém ouve quando você diz que seu ex-marido está tentando matá-la, se ninguém acredita quando você diz que está sofrendo, se ninguém escuta quando você pede socorro, se você não se atreve a pedir socorro, se você foi ensinada a não incomodar os outros pedindo socorro. Se consideram que você saiu da linha ao falar numa reunião, se não é admitida numa instituição de poder, se está sujeita a críticas improcedentes que trazem implícito que ali não é lugar de mulher ou que mulher não é para ser ouvida. Histórias salvam a sua vida. Histórias são a sua vida. Nós somos as nossas histórias, que podem ser a prisão ou o pé de cabra que vai arrombar a porta; criamos histórias que nos salvam ou que nos prendem, a nós ou a outros, histórias que nos elevam ou nos esmagam contra o muro de pedra dos nossos medos e limitações. A libertação sempre é, em parte, um processo de contar uma história: romper histórias, romper silêncios, criar novas histórias. Uma pessoa livre conta a sua história própria. Uma pessoa valorizada vive numa sociedade em que a história ocupa um lugar.

O mundo desdobrável: Ensaios para depois do fim
Carola Saavedra

O que pode a literatura? Que horizontes ela é capaz de alcançar? Ou, mais especificamente, o que pode a literatura em um mundo em colapso, assombrado pelo aquecimento global, por pandemias, ascensão da extrema-direita, aumento da miséria, entre outras tragédias? Em suma, em uma realidade na qual tudo parece mais urgente que a literatura?”. Com estas perguntas, a escritora brasileira Carola Saavedra abre o primeiro livro de ensaios de sua já consolidada carreira como romancista. São questionamentos que dão base a todas as reflexões, notas biográficas e esboços ficcionais que compõem estas páginas. Através de uma escrita que incorpora a dinâmica de um “mundo desdobrável”, Carola reúne temas como o fi m do mundo, ancestralidade, permacultura, psicanálise, literatura feita por mulheres, literatura indígena, reflexões sobre Carolina Maria de Jesus, Hilda Hilst, Clarice Lispector e muitas/os outras/os expoentes das artes, do cinema e da filosofia. Também comparecem Dom Quixote e o nascimento do romance moderno, assim como a ideia da literatura além da escrita, a literatura como oráculo, revelação e abertura de novas possibilidades impensadas. O que pode, portanto, a literatura? Neste livro, ela parece poder muito.

Menções:

Para que algo aconteça | For something to happen
2018

Apresentação: Priscila Costa Oliveira e Maria Flor
Convidada: Ana Teixeira
2023
Trilha sonora: Find Your Way Beat - Nana Kwabena 
Vinheta: @beca.schmitt

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